Escrito em: 26/05/2014.
Revisado em: 03/10/2018.
Palavras-chave: Fé, Acreditar, Relativismo religioso, Teoria da Evolução, Neurociência, Cérebro, Mente.
Um bebê vem ao mundo com nada ou quase nada de informações extragenéticas, ou seja, em nível consciente.
Conforme o tempo passa seu cérebro irá crescer, absorvendo estímulos do
seu meio ambiente social, com seus neurônios se ligando de maneira a
aprender, se comunicar, formar modelos da realidade – a água é fluida,
escorre entre as mãos - etc. É uma atitude inconsciente quando, por exemplo, ele tira
sua mão de um copo de leite muito quente. Já trouxe consigo, como uma
reação natural do tato, engendrada em seu cérebro pelos seus genes, mas
agora, com
outro sentido, a visão, e, em conjunto com a inteligência e sua
memória, o farão a ser cauteloso em situação parecida, chegando com sua
mão próxima a outro copo, com aquele líquido branco, verificando se pode
pegá-lo ou não. Observará sua mãe esquentando aquele líquido no fogo em
outro recipiente para colocá-lo em copos. A informação extragenética é
algo muito poderoso em sua vida. É o aprendizado.
Mas
não só o intelecto atua na criança em seu despertar para as informações
e experiências vitais ao seu desenvolvimento e adaptabilidade. As
emoções estão presentes também. Ela voltará a comer uma fruta, do tipo
daquela a qual o gosto lhe proporcionara uma sensação maravilhosa de
bem-estar, de prazer, mesmo sem fome. Vontade, ânsia, desejo, emoções
básicas do ser humano quando da interação com o seu meio ambiente.
Como disse em meu artigo “O porquê dos nossos sentimentos – 02” (1):
“somos seres racionais e emocionais, não podendo separar uma
característica da outra quando em muitos envolvimentos interativos. E
acontecem nas mais diferentes formas e intensidades.”
A
alimentação é algo imprescindível na vida de um ser humano, na
sobrevivência de sua espécie, mas também podemos falar em algo também
importante, ligado ao seu bem-estar e à sobrevivência: o equilíbrio emocional. Irei falar sobre ele nos dois próximos parágrafos.
Equilíbrio
é fundamental em nossas vidas pessoais e profissionais. Sem ele não
poderíamos viver a vida na plenitude pretendida por nós. Não dormiríamos
quantitativamente e qualitativamente a repormos nossas energias,
estaríamos em constante choque com os nossos semelhantes ou passivos
demais para lutarmos em busca de nossas necessidades materiais,
viveríamos com medo de tudo ao nosso redor, prejudicando seriamente
nosso presente e futuro, etc.
Nosso
equilíbrio é afetado por desordens internas e/ou externas a nós.
Nascemos com metade dos genes de cada um de nossos pais. Os genes
constroem nossos cérebros a partir da concepção e um ou mais erros nessa
construção poderão levar-nos a problemas mentais no futuro. Mas não é
só isso.
Conforme o cérebro se desenvolve da idade infantil até a fase adulta,
os estímulos negativos e positivos do meio, simplificando ao máximo
possível esse fato, poderão afetar as ligações sinápticas dessa
arquitetura neural, levando-o a um mau funcionamento de várias de suas
áreas. Isso acarreta em comportamentos inadequados ao mundo em nosso
redor.
Uma
criança tem em seu início de vida muita informação passada pelos pais,
irmãos, parentes, amigos, escola, etc. Seu cérebro vai se desenvolvendo
com todas essas informações e também com conceitos a respeito de tudo, de religião também. Essa época em sua vida é uma das mais importantes na formação de seu caráter e personalidade.
Imagine
por exemplo uma criança em um meio ambiente formado por pessoas adeptas
do cristianismo. Logo cedo alguém diz para ela: “olhe, existe ‘alguém’ poderoso, Deus, criador do céu, da noite, das estrelas, do
Sol, etc. Plantas, animais, os rios”. É evidente a aceitação, a
admissão por parte da criança de informações desse tipo, pois vêm de
pessoas importantes para ela e porque, naturalmente, existe uma poderosa
capacidade dela em... Acreditar! Uma questão ela pode achar absurda,
deixar para lá, poderá ouvir mais o pai e não a mãe sobre um fato
religioso, etc. Dá para imaginar a quantidade de conceitos e informações
e como são passados a ela de forma inquestionável e absoluta?
Na
escola, com amigos, nas outras cidades e regiões de seu país, com
pessoas adultas mal conhecendo-a, etc., todo o seu meio ambiente
sintonizado no cristianismo. Ela cresce sendo ensinada do modo como o
seu meio ambiente é, e, de uma maneira ou de outra, acredita nas
histórias. Seu cérebro se desenvolve com essas informações e é possível,
quando jovem ou adulta, passar a estudar e crer em outras religiões.
Mas, na maioria dos casos, agora generalizando, terá uma marca
permanente desde a infância. Seus neurônios se ligaram formando redes
quase indestrutíveis.
Simplificadamente,
para o propósito no qual me dedico a este artigo, os fatos ocorrem
desse jeito, com o futuro adulto passando a acreditar nos ritos, dogmas,
crenças, etc., do cristianismo, da igreja a ele associada.
Acreditar
é crer, ter como verdadeiro. Fé é crença, crédito, confiança, convicção
da existência de algum fato ou da veracidade de alguma asserção. A
pessoa a qual estou me referindo aprenderá, acreditará e terá fé naquilo ensinado pelos outros, sentindo um poder bem forte a reverenciar o seu Deus para qualquer propósito.
No
meu artigo “O Surgimento de uma religião como uma necessidade humana”,
(2) cito um grupo de homo sapiens em uma ilha, no qual ideias sobre de
onde vieram, quem são eles, por que
estão vivos, para onde irão após a morte, lidar com o bem e o mal,
etc., são fatos curiosos e ao mesmo tempo perturbadores. Questionamentos
como esses sempre existiram na imaginação das pessoas em todas as
épocas e lugares.
Acredito na possibilidade do
equilíbrio emocional ser alterado se as pessoas não tiverem a
capacidade em crer e colocar essa vantagem em prática. Naturalmente isso
é feito devido a nossa condição quando nascemos, possuindo consciência a
despertar por volta dos quatro anos de idade, fé e amor próprio, sendo
isso um tema já abordado por mim em “O porquê dos nossos sentimentos”
(3) e em “Consciência, amor-próprio, fé
e transcendência”. (4) Em minhas palavras no primeiro: “A consciência,
indo mais longe, precisa necessariamente de, no mínimo, dois suportes
emocionais para perpetuar, duas forças poderosíssimas: a fé e o amor
próprio. Qual espécie de seres conscientes conseguiria sua perpetuação
se não acreditassem em si mesmos, no seu trabalho, na sua luta diária?
Ou, como na maioria dos habitantes do planeta, em algo divino para se
apoiarem? E também qual sistema poderia sobreviver se não gostasse de si
próprio? Adiantaria um corpo forte em uma mente fraca? Talvez cheguemos
a um fato universal: qualquer ser consciente no cosmo terá esse tipo de
característica. Talvez não exista nada somente racional.”
O
acreditar pode ocorrer sem a fé. Você acredita em algo, mas não possui
fé naquilo, não coloca suas forças e energias se valendo desse sentimento poderoso. Um cristão pode acreditar em Deus mas não ter fé suficiente para seguir sua religião como outros o fazem. Mas ele acredita e acreditar
é “tomar como verdadeiro”. Mas como ele possui essa verdade? As
definições de tudo de sua religião? Foram passadas, como disse acima,
muitas informações, conceitos etc., pelo seu meio ambiente: seus pais,
escola, ambientes sociais, etc. E fatos desses tipos acontecem em todo o
mundo, em todas as épocas, é válido para tudo criado pelo homem até
hoje como deuses, Deus, dogmas, seitas, rituais, religiões, etc. É o relativismo religioso. E meio
ambiente não é só a natureza. Para o homem o conceito é amplo, maior que
para outros organismos vivos em seus habitats, mesmo possuindo relações
sociais sofisticadas em relação a outros, como os primatas.
Um
ateu, embora tenha uma percepção, conseguindo imaginar algo além do
mundo material, propriedade essa comum aos humanos, não acredita em
deuses ou Deus, influenciando nosso mundo. Não sente nada, “não precisa”
e mesmo se sentir alguma coisa poderá rejeitar usando sua lógica, por
exemplo. Dirá o seguinte: “é uma invenção da minha mente”. Ele é minoria
nas populações porque essas sim necessitam da fé e do acreditar. Agora,
ele acredita em si próprio, possui fé em si mesmo, porque se não,
ele nem levantaria da cama para viver. Viver em seu conceito básico
conhecidos por todos nós: trabalhar, cuidar da família, o lazer,
estudar, etc. Acordamos de manhã, levantamos a cabeça e começa um novo
dia. Sempre foi assim para nós humanos e sempre será.
Outra pessoa possui fé inabalável em suas crenças.
Seja qual for a sua religião, os ensinamentos passados a ela, os dogmas
e rituais são absolutos a ponto de melhorar seu estado emocional quando
necessário.
Isto
dá um artigo inteiro, mas, por exemplo, pense na perda de um ente
familiar para alguém bem religiosa, no caso, cristã. Poderia ser de
outra religião. Ela acredita, possui fé suficiente para pensar, sentir,
um “fato” admitido por todos os cristãos: seu familiar estará em um
lugar próximo a Deus, na forma de alma ou espírito. Difícil,
simplificando o assunto, seria achar alguém tão forte quanto ela. No mínimo suportará a dor como outra cristã praticante.
Em “E o Homem Criou Deus” (5) eu digo: “É confortante para o homem acreditar em algo superior, transcendental, que o ajude e o ampare. Ter consciência do mundo, da existência de uma separação entre nós e o que
nos cerca, pode levar-nos a uma solidão juntamente com uma insuportável
crise existencial. O homem não aguentaria viver neste mundo sem algo de
superior a acreditar. Mais uma vez, outro 'amortecedor' natural oriundo
da fé”.
Então temos: sentimentos a respeito de onde viemos, quem somos nós, porque estamos aqui e para onde vamos após a morte; uma questão muito importante: como lidar com o bem e o mal? Por que existem? A impossibilidade de entender o infinito e, aqui, colocando esta questão, também digo: o ser
humano sempre buscou algo para justificar, entender a criação. Para o
homo sapiens deveria e deve existir algo a criar tudo e como esse tudo
não era pequeno, esse “algo” necessariamente seria superior. Ou “algos”, referindo-me a deuses porque a maioria das sociedades humanas até hoje foram politeístas.
A capacidade humana em acreditar e possuir fé, sociedades a criarem religiões, seitas, crenças, etc., como formas de entender questões cruciais de suas existências, de suas condições por vezes limitadas, etc., se não existissem, comprometeriam o equilíbrio emocional das pessoas.
Sem estrutura emocional, sem equilíbrio, você teria uma vida
confortável em muitos aspectos? Não. Ele não é necessariamente tudo, mas
é muito importante.
Um sistema complexo, consciente de si, capaz de imaginar por lógica a existência de um mundo além do nosso, teria, na minha opinião, vantagens
evolutivas como o acreditar e a fé, a preencher esse outro mundo com
seres sobrenaturais capazes de realizações a nosso favor.
A evolução não se processa só no corpo dos seres vivos; se processa também no comportamento via estruturas neurais, em nossos cérebros, em nossas mentes.
Referências:
1 – Argos Arruda Pinto. O porquê dos nossos sentimentos. 2002. Disponível em: < http://www.cerebromente.org.br/n15/opiniao/sentimentos2.html >. Acesso em: 03/10/2018.
Também no meu blog: “Neurociência, Teoria da Evolução, Sentimentos e Emoções”. Disponível em: < http://sistemaevolucaoneurociencia.blogspot.com.br/ >. Acesso em: 03/10/2018.
2 – Argos Arruda Pinto. O surgimento de uma religião como uma necessidade humana”. 2008. Disponível em: < http://orelativismodasreligioes.blogspot.com/2008/01/o-surgimento-de-uma-religio-como-uma_11.html >. Acesso em: 03/10/2018.
3 – Argos Arruda Pinto. O porquê dos nossos sentimentos. 2001. Disponível em: < http://www.cerebromente.org.br/n14/opinion/material3.html >. Acesso em: 03/10/2018.
4 – Argos Arruda Pinto. Consciência, amor-próprio, fé e transcendência - A moderna Teoria da Evolução. 2012. Disponível em: < http://coamoprofetrans.blogspot.com/ >. Acesso em: 03/10/2018.
5 – Argos Arruda Pinto. E o homem criou Deus. 2007. Disponível em: < www.orelativismodasreligioes.blogspot.com >. Acesso em: 03/10/2018.